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Lei n. 9/2002

REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU

Lei n.º 9/2002

Lei de Bases da Segurança Interna da Região Administrativa Especial de Macau

A Assembleia Legislativa decreta, nos termos da alínea 1) do artigo 71.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, para valer como lei, o seguinte:

CAPÍTULO I

Princípios gerais

Artigo 1.º

Definição e fins da segurança interna

1. A segurança interna é a actividade permanente e plurisectorial desenvolvida pela Região Administrativa Especial de Macau, adiante designada por RAEM, no sentido de garantir a ordem, a tranquilidade pública e a protecção de pessoas e bens, prevenir e investigar a criminalidade e controlar a migração, contribuindo assim para assegurar a estabilidade social e o exercício dos direitos e liberdades fundamentais das pessoas.

2. A actividade de segurança interna inclui, ainda, as medidas de rotina e excepcionais de protecção civil que visem a resposta aos efeitos das calamidades públicas e a respectiva prevenção.

3. As medidas previstas no presente diploma visam especialmente proteger a vida e a integridade das pessoas, a paz pública e a ordem estabelecida contra a criminalidade violenta ou organizada, nela se incluindo as actividades internas que favoreçam a criminalidade transnacional e o terrorismo internacional.

Artigo 2.º

Princípios fundamentais

1. A actividade de segurança interna exerce-se nos termos da lei, designadamente da lei penal e processual penal e das leis orgânicas das corporações e serviços de segurança, e pauta-se pela observância das regras gerais de polícia e pelo respeito dos direitos, liberdades e garantias das pessoas.

2. As medidas cautelares de polícia são as previstas na lei, apenas devendo ser utilizadas quando se mostrar absolutamente necessário à salvaguarda e garantia da paz e tranquilidade públicas.

3. A prevenção dos crimes só pode fazer-se com observância das regras gerais sobre polícia e com respeito pelos direitos, liberdades e garantias das pessoas.

Artigo 3.º

Política de segurança interna

A política de segurança interna consiste no conjunto de princípios, orientações e medidas tendentes à prossecução permanente dos fins definidos no artigo 1.º

Artigo 4.º

Âmbito territorial

A segurança interna desenvolve-se no espaço do território da RAEM, sem prejuízo dos compromissos internacionais ou inter-regionais a que a RAEM esteja vinculada.

Artigo 5.º

Deveres gerais e especiais de colaboração

1. Todas as pessoas têm o dever de colaborar na prossecução dos fins de segurança interna, observando as disposições preventivas estabelecidas na lei, acatando as ordens e mandados legítimos das autoridades e não obstruindo o normal exercício das competências dos funcionários e agentes das corporações e serviços de segurança.

2. O dever de colaboração abrange o de colocar ao dispor das autoridades, em situações de ameaça da segurança interna ou de calamidade, sempre que requisitados e sem prejuízo da indemnização que for devida, os meios logísticos e técnicos, incluindo equipamento, instalações e pessoal técnico, de sua pertença ou sob sua direcção, ou de pessoa colectiva de que façam parte.

3. Os trabalhadores da Administração Pública da RAEM ou das pessoas colectivas públicas têm o dever especial de colaboração com as corporações e serviços de segurança, designadamente o de comunicar prontamente às autoridades judiciárias ou policiais todos os factos de que tenham conhecimento no exercício das suas funções, ou por causa delas, e que constituam preparação ou manifestação de quaisquer acções criminosas atentatórias da segurança interna ou da ordem internacional, a cuja protecção a RAEM esteja vinculada.

4. A violação do disposto no número anterior implica responsabilidade disciplinar e criminal, nos termos da lei.

Artigo 6.º

Cooperação das corporações e serviços de segurança

1. As corporações e serviços de segurança exercem a sua actividade de acordo com os objectivos e finalidades da política de segurança interna e dentro dos limites do respectivo enquadramento orgânico.

2. Sem prejuízo do disposto no número anterior, as corporações e serviços de segurança cooperam entre si, designadamente através da comunicação recíproca de dados não sujeitos a regime especial de reserva ou protecção que, não interessando apenas à prossecução dos objectivos específicos de cada força ou serviço, sejam necessários à realização das finalidades de cada um dos outros.

CAPÍTULO II

Coordenação e execução da política de segurança interna

SECÇÃO I

Chefe do Executivo

Artigo 7.º

Competência do Chefe do Executivo

O Chefe do Executivo é o responsável máximo pela segurança interna da RAEM, competindo-lhe designadamente:

1) Definir a política de segurança interna;

2) Programar e assegurar os meios destinados à execução da política de segurança interna;

3) Aprovar o plano de coordenação e cooperação das corporações e serviços legalmente incumbidos da segurança interna e garantir o regular funcionamento dos respectivos sistemas;

4) Fixar, nos termos da lei, as regras de classificação e controlo de circulação dos documentos oficiais e de credenciação das pessoas que devem ter acesso aos documentos classificados;

5) Coordenar a articulação entre os principais responsáveis das diversas áreas de governação sempre que razões de segurança interna o exijam;

6) Dirigir a actividade interdepartamental tendente à adopção, em caso de grave ameaça à segurança interna, das providências julgadas adequadas, incluindo, se necessário, o emprego operacional conjunto e combinado do pessoal, equipamento, instalações e outros meios atribuídos a cada uma das corporações e serviços de segurança;

7) Agravando-se as condições previstas na alínea anterior, colocar sob um comando conjunto, as corporações e serviços ou suas subunidades específicas, tidos por adequados e necessários a responder à situação verificada;

8) Definir o grau de autoridade em que fica investido o comando conjunto referido na alínea anterior;

9) Requisitar os meios logísticos e técnicos a que se refere o n.º 2 do artigo 5.º;

10) Aprovar planos de contingência para espaços ou eventos que, pela sua especial destinação ou relevância, justifiquem a adopção de medidas especiais de segurança.

Artigo 8.º

Restrição de direitos

1. Em caso de emergência perante grave ameaça de perturbação da segurança pública interna e com observância do disposto no artigo 40.º da Lei Básica, o Chefe do Executivo pode decretar medidas de restrição do exercício de direitos, liberdades e garantias, consideradas razoáveis, adequadas e proporcionais à manutenção da ordem e tranquilidade públicas, por período de tempo não superior a 48 horas.

2. A prorrogação das medidas decretadas ao abrigo do número anterior carece de consulta ao Conselho Executivo, sendo, de imediato, comunicada ao Presidente da Assembleia Legislativa.

SECÇÃO II

Conselho de Segurança

Artigo 9.º

Definição e atribuições

1. O Conselho de Segurança é o órgão especializado de consulta e apoio do Chefe do Executivo em matéria de segurança interna.

2. Cabe ao Conselho de Segurança, enquanto órgão de consulta, emitir parecer, nomeadamente sobre:

1) A definição da política de segurança interna;

2) As bases gerais da organização, funcionamento e disciplina das corporações e serviços de segurança;

3) Os projectos de diploma que contenham providências de carácter geral respeitantes às atribuições e competências das corporações e serviços de segurança;

4) As grandes linhas de orientação a que devem obedecer a formação, especialização, actualização e aperfeiçoamento do pessoal das corporações e serviços de segurança;

5) A eventual adopção das medidas de excepção referidas no artigo 8.º, quando para tal solicitado pelo Chefe do Executivo;

6) Outras matérias que lhe sejam cometidas por lei ou que lhe sejam submetidas pelo Chefe do Executivo.

Artigo 10.º

Composição

1. O Conselho de Segurança é presidido pelo Chefe do Executivo e dele fazem parte na qualidade de membros permanentes as seguintes entidades:

1) Os Secretários do Governo, cabendo ao Secretário para a Segurança a vice-presidência;

2) O comandante-geral dos Serviços de Polícia Unitários e o director-geral dos Serviços de Alfândega;

3) O comandante do Corpo da Polícia de Segurança Pública;

4) O director da Polícia Judiciária;

5) O comandante do Corpo de Bombeiros;

6) O presidente da Autoridade de Aviação Civil de Macau;

7) O director da Capitania dos Portos de Macau.

2. São membros não permanentes do Conselho de Segurança, nele participando sempre que para tal convocadas pelo Presidente, as seguintes entidades:

1) O presidente do Conselho de Administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais;

2) O director dos Serviços de Saúde;

3) O director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes;

4) O director dos Serviços Meteorológicos e Geofísicos;

5) O presidente do Instituto de Acção Social;

6) O director do Instituto de Habitação;

7) O director do Estabelecimento Prisional de Macau;

8) O director dos Serviços das Forças de Segurança de Macau;

9) O director da Escola Superior das Forças de Segurança de Macau;

10) O director dos Serviços de Turismo.

3. O Presidente pode convocar para participar no Conselho de Segurança quaisquer outras entidades que, pelos seus conhecimentos especializados ou responsabilidades específicas, possam contribuir para a análise da segurança interna ou para a resposta a situações de crise ou de calamidade pública.

4. Tem ainda assento no Conselho de Segurança um representante do Ministério Público da RAEM, com vista a acompanhar as questões relativas ao exercício da acção penal e à defesa da legalidade e dos interesses legalmente protegidos.

5. O Conselho de Segurança é secretariado pelo coordenador do Gabinete Coordenador de Segurança.

SECÇÃO III

Gabinete Coordenador de Segurança

Artigo 11.º

Natureza

1. O Gabinete Coordenador de Segurança é um órgão especializado de assessoria e apoio do Conselho de Segurança, funcionando na directa dependência do Secretário para a Segurança.

2. Todas as entidades representadas no Conselho de Segurança devem colaborar com o Gabinete Coordenador de Segurança, nomeadamente quanto à dotação de pessoal e ao acesso a dados, informações e demais elementos que permitam um acompanhamento permanente e sistemático da situação da segurança interna.

3. Sem prejuízo do disposto no número anterior, o apoio administrativo e logístico ao Gabinete Coordenador de Segurança é prestado pela Direcção dos Serviços das Forças Segurança de Macau.

Artigo 12.º

Coordenação

1. O Gabinete Coordenador de Segurança é dirigido por um coordenador, nomeado em regime de comissão de serviço, a quem compete estabelecer a ligação entre as entidades com assento no Conselho de Segurança, por forma a prosseguir as atribuições enumeradas no artigo anterior.

2. As necessidades de recursos humanos para a prossecução da actividade do Gabinete Coordenador de Segurança são preenchidas em regime de:

1) diligência, se se tratar de pessoal abrangido pelo Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau; e

2) destacamento, se se tratar de pessoal abrangido pelo regime geral vigente para os trabalhadores da administração pública.

3. Para efeitos da alínea 1) do número anterior a diligência tem a duração de um ano.

SECÇÃO IV

Sistema de Segurança Interna

Artigo 13.º

Composição

1. Integram o sistema de segurança interna da RAEM as corporações e serviços de segurança, cujas finalidades orgânicas concorram directamente para garantir a segurança interna e a protecção civil da RAEM, assim como os Serviços de Polícia Unitários e os Serviços de Alfândega.

2. Para efeitos do disposto no número anterior, são considerados:

1) Corporações, os seguintes organismos da administração pública:

(1) O Corpo de Polícia de Segurança Pública;

(2) O Corpo de Bombeiros;

2) Serviços de segurança, os seguintes organismos da administração pública:

(1) A Polícia Judiciária;

(2) A Autoridade de Aviação Civil de Macau, no âmbito da segurança do transporte aéreo;

(3) A Capitania dos Portos, no exercício da Autoridade Marítima;

(4) A Direcção dos Serviços das Forças de Segurança de Macau;

(5) A Escola Superior dos Serviços de Forças de Segurança de Macau;

(6) O Departamento de Inspecção Marítima dos Serviços de Alfândega;

(7) O Corpo de Guardas Prisionais do Estabelecimento Prisional de Macau.

3. Consideram-se também como integrando o Sistema de Segurança Interna da RAEM os demais serviços e organismos públicos que, segundo os planos de contingência, participarem na estrutura da protecção civil, quando activada.

Artigo 14.º

Forças de Segurança de Macau

Constituem as Forças de Segurança de Macau os organismos referidos na alínea 1) e em (4) e (5) da alínea 2) do n.º 2 do artigo anterior.

SECÇÃO V

Comando conjunto

Artigo 15.º

Responsabilidade de comando

1. A responsabilidade do comando conjunto do comandante-geral dos Serviços de Polícia Unitários é delegável, avaliadas que sejam as características específicas da crise em presença, em entidade que garanta o nível de autoridade adequado ao efectivo comando, direcção e controlo operacional sobre o emprego de uma força conjunta de corporações ou serviços dotados dos meios atribuídos, por forma a dar resposta eficaz e repor a normalidade.

2. A delegação a que se refere o número anterior carece de homologação do Chefe do Executivo indelegável, sempre que a acção conjunta envolva entidades alheias à área de governação da segurança.

Artigo 16.º

Regime de autoridade

1. O comandante do comando conjunto está dotado do estatuto de autoridade de polícia criminal, quando no exercício efectivo das funções de comando e direcção operacional a que se refere o artigo anterior.

2. Todo o pessoal integrado na força conjunta sob o comando da entidade a que se refere o número anterior está dotado do estatuto de autoridade pública, quando no exercício efectivo de funções.

CAPÍTULO III

Medidas preventivas

Artigo 17.º

Medidas cautelares de polícia

1. Na prossecução da actividade de segurança interna, as autoridades policiais podem, no âmbito das respectivas competências e sem prejuízo da observância da lei, determinar a aplicação das seguintes medidas cautelares de polícia:

1) Vigilância policial de pessoas, edifícios e estabelecimentos por período de tempo determinado;

2) Exigência de identificação de qualquer pessoa que se encontre ou circule em lugar público ou sujeito a vigilância policial;

3) Apreensão temporária de armas, munições e explosivos;

4) Impedimento de entrada na RAEM ou expulsão de não residentes que, nos termos da lei, sejam considerados inadmissíveis ou constituam ameaça para a estabilidade da segurança interna, ou sejam referenciados como suspeitos de conotações ao crime transnacional, incluindo o terrorismo internacional.

2. No âmbito do combate à criminalidade organizada, designadamente a de natureza transnacional ou conotada com o terrorismo internacional, incluindo as acções de recrutamento e ou treino de pessoas para tais fins, pode fazer-se uso, ainda, das seguintes medidas cautelares especiais de polícia:

1) Encerramento preventivo de estabelecimentos destinados ao fabrico, depósito ou venda de armas, munições e explosivos;

2) Encerramento preventivo de estabelecimentos e instalações destinados ao fabrico, depósito ou venda de substâncias eventualmente precursoras de armas nucleares, bacteriológicas e químicas, bem como apreensão e selagem, até que a autoridade judiciária defina o destino das referidas substâncias;

3) Revogação ou suspensão de autorizações aos titulares dos estabelecimentos referidos na alínea anterior;

4) Cessação da actividade de empresas, grupos, organizações ou associações que, de alguma forma, estejam ligadas à prática dos actos referidos nas alíneas 1) e 2).

3. As medidas cautelares especiais previstas no número anterior devem ser comunicadas imediatamente à autoridade judiciária competente para efeitos de validação.

Artigo 18.º

Controlo de comunicações

1. Em presença de fortes indícios de perturbação da segurança interna por acção de actividades criminosas, os Serviços de Polícia Unitários podem propor ao Juiz de Instrução Criminal que ordene a execução do controlo das comunicações, designadamente escritas, telefónicas, informáticas ou outras, nos termos dos artigos 172.º a 175.º do Código de Processo Penal.

2. A execução das medidas decretadas ao abrigo do número anterior cabe ao organismo subordinado dos Serviços de Polícia Unitários dotado da necessária capacidade técnica para o efeito.

Artigo 19.º

Dever de identificação

Os agentes policiais das corporações e serviços de segurança que, nos termos da lei, ordenarem a identificação de pessoas ou emitirem qualquer outra ordem ou mandado legítimo devem previamente exibir prova da sua qualidade.

CAPÍTULO IV

Disposições finais

Artigo 20.º

Cooperação internacional e inter-regional

Os Serviços de Polícia Unitários, através dos respectivos organismos policiais subordinados, e os Serviços de Alfândega asseguram, no âmbito das respectivas atribuições, a cooperação internacional e inter-regional em todas as matérias relativas à criminalidade violenta e transnacional, designadamente o terrorismo internacional, o tráfico de pessoas, o branqueamento de capitais, o tráfico de armas, o tráfico de estupefacientes, a criminalidade informática e a criminalidade contra o ambiente.

Artigo 21.º

Proibição de designação, sinal ou uniforme

É proibido o uso, por parte de qualquer pessoa singular ou colectiva, de nome, designação, logotipo, insígnia, uniforme ou qualquer outro sinal distintivo que possa ser confundido com os usados pelas entidades constantes do artigo 13.º

Artigo 22.º

Regulamentação

O desenvolvimento complementar do regime constante da presente lei é feito por regulamento administrativo.

Artigo 23.º

Revogações

São revogados os seguintes diplomas:

1) Decreto-Lei n.º 76/90/M, de 26 de Dezembro;

2) Decreto-Lei n.º 26/98/M, de 22 de Junho.

Aprovada em 27 de Novembro de 2002.

A Presidente da Assembleia Legislativa, Susana Chou.

Assinada em 4 de Dezembro de 2002.

Publique-se.

O Chefe do Executivo, Ho Hau Wah.


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